Clipping

STJ anula invasão domiciliar baseada em denúncia anônima e tentativa de fuga

O direito constitucional da inviolabilidade do domicílio não pode ser afastado com base em simples delação anônima, desamparada de elementos fundados da suspeita da prática de crimes. A fuga para dentro da residência ao avistar os policiais também não justifica a medida.

Com esse entendimento, a ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, anulou provas obtidas em uma busca domiciliar e absolveu um homem acusado de tráfico de drogas. A decisão foi estendida a um corréu.

Os policiais militares apreenderam 444 gramas de maconha e 0,25 grama de cocaína. O réu foi condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais a cinco anos e dez meses de prisão em regime semiaberto, além de 583 dias-multa.

Ao STJ, o advogado de defesa, Raphael Henrique Dutra Rigueira, alegou que as provas seriam nulas, pois o ingresso dos PMs na casa do réu ocorreu sem mandado judicial e sem justa causa.

Os policiais alegaram que receberam denúncias anônimas e permaneceram de campana em volta da casa do suspeito. Quando percebeu que seria abordado, o réu teria tentado fugir para dentro do imóvel. Já o corréu teria tentado esconder uma sacola plástica dentro da qual estavam as drogas.

Por sua vez, os réus alegaram que não portavam nenhuma sacola e que os entorpecentes teriam sido levados pelos próprios PMs para forjar um flagrante.

No boletim de ocorrência, os agentes informaram que o réu teria autorizado sua entrada na casa. Mas tal consentimento não foi confirmado em juízo.

Para a ministra relatora, o ingresso forçado na residência não foi devidamente justificado, pois se baseou apenas "na suposta existência de denúncias anônimas recebidas pelos policiais", "no fato de que o réu teria corrido para dentro da residência diante da aproximação dos agentes públicos" e na "suposta autorização do acusado", que não foi "comprovada por escrito ou por meio audiovisual".

A magistrada lembrou de precedente da 6ª Turma da corte, que exige autorização do morador filmada e, se possível, registrada em papel para o ingresso no domicílio.

Laurita ainda ressaltou que os PMs não mencionaram ter visualizado as drogas previamente. As substâncias só foram encontradas no interior do imóvel.

Jurisprudência vasta
A legalidade da invasão de domicílio por policiais militares é um tema analisado frequentemente pelas turmas criminais do STJ. Elas vêm delineando limites de identificação das razões para se ingressar na casa de alguém sem mandado judicial. Uma situação semelhante à dos autos recentemente teve o mesmo desfecho.

A 5ª Turma também já adotou a tese da necessidade de autorização filmada e escrita do morador. Porém, a ordem foi anulada por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, em dezembro do último ano.

O STJ já entendeu ilícita a invasão nos casos em que a abordagem é motivada por denúncia anônima, pela fama de traficante do suspeito, por tráfico praticado na calçada, por atitude suspeita e nervosismocão farejadorperseguição a carro ou apreensão de grande quantidade de drogas.

Também já foram anuladas provas quando a busca domiciliar ocorreu após informação dada por vizinhos e depois de o suspeito fugir da própria casa ou fugir de ronda policial. Em outro caso, foi considerada ilícita a apreensão feita após autorização dos avós do suspeito para ingresso dos policiais na residência.

Outro entendimento firmado foi de que o ingresso de policiais na casa para cumprir mandado de prisão não autoriza busca por drogas. Da mesma forma, a suspeita de que uma pessoa poderia ter cometido o crime de homicídio em data anterior não justifica a invasão do domicílio. O mesmo vale para situações em que há controvérsia entre as declarações dos policiais e do réu sobre a autorização livre do morador para a entrada na residência.

Por outro lado, o ingresso é considerado válido quando há autorização do morador ou em situações já julgadas, como quando ninguém mora no local, se há denúncia de disparo de arma de fogo na residência ou flagrante de posse de arma na frente da casa, se é feita para encontrar arma usada em outro crime — ainda que por fim não a encontre —, se ocorrer em diligência de suspeita de roubo ou se o policial, de fora da casa, sente cheiro de maconha, por exemplo.

Clique aqui para ler a decisão
HC 765.344


Fonte: ConJur